28.11.08

DA COR DO AMOR


Da cor do amor

O vinho intenso rubi, cor de pecado selvagem que agora molha meus lábios, leva meus devaneios para além do desejo. Estou perdido nos encontros e desencontros da existência capciosa. Todos os dias são simples dias que passam. Carpe diem! Eis a regra. A voz sensual de Norah Jones traz no som do Jazz uma complexa harmonia que pertencem somente às almas livres. Como é doce e contraditória essa tal liberdade. Assim como o amor se tece nos beijos e nos sonhos do improvável. Combinação exótica de alquimista que resulta no elixir da possível felicidade.
Meu amigo está envolto em dúvidas. Os momentos indesejáveis, mas necessários, de solidão o aprisionam entre a imposta normalidade e o desejo do rompimento tradicional. Como amar? Quem amar? Por que amar? Caro amigo essas são dúvidas que não se pode cogitar. Ame, sofra, chore, fique isolado, crie vínculos, se aproxime e se distancie no mesmo ritmo que tua alma de poeta oculto exige. Lembre-se do grande poeta Ovídio, pai da Arte de amar. No amor não existe pecado. "É a arte com que a vela e o remo são manejados que permite às naus navegarem rapidamente, a arte que permite às carruagens correrem ligeiras: a arte deve governar o amor". Sejamos então nobres artistas. Se o amor não estiver envolto em magia deixa de ser amor e se torna qualquer outra coisa animalesca, fria, cartesiana, pode-se dizer. Se há magia o amor pode ser uno ou múltiplo, breve ou duradouro, mas sempre será eterno. Grande Vinicius de Moraes, nada como um poeta vagabundo para nos dizer o que é amar. Descobre-se a magia e com ela, descobre-se o mundo.
Tudo é provável, inclusive o impossível. Há gozo em tudo. Um livro, vinhos, cafés, musica, sexo, paixão, no lírio que nasce no campo ou no por do sol que se desmancha intocável e penetrante. Deve-se esquecer os devaneios psicológicos, as lições morais de um cristianismo decadente, a tradição de uma moral provisória e as regras que não criamos. Deixe-se de lado aqueles reles mortais que estão demasiado presos às regras de uma cultura manipulada. Todos morrerão sem nenhuma vida. Esquecidos devem ser os críticos que por serem incapazes de produzir gastam seu tempo com calúnias adversas. Que tenhamos todos o necessário para a sobrevivência e o acesso aos prazeres da existência. Brindemos com essa taça de vinho que aquece a alma. Brindemos às contradições que nos confundem, às ciências que nos tolhem a liberdade e a benevolência dos deuses que nos jogam no submundo da perversa sensualidade.
Meu único desejo, em tão perdido momento, não é a ausência de tormentos, mas que jamais se afasta de mim esse cálice de intenso fulgor, vinho rubi tal qual a cor do amor.

Sidinei Cruz Sobrinho
Passo Fundo 28 de novembro de 2008

3.11.08

ENCONTRO E PERDIÇÃO

O ser humano é um ser que se perde no encontro. O ato de se encontrar é sempre um ato de estranheza e perdição. A estranheza se dá porque o "Outro" é inacessível, portanto, sempre estranho ao meu "Eu" que causa e é causado no encontro.
Perdição é o ato de desconhecer a si mesmo no encontro que é sempre diferente. Quer dizer, o encontro é imprevisível e sempre muda os que se encontram. A mudança é imperceptível em curto prazo.
A chuva se encontra com a semente e se perde no seio da terra que acolhe a própria semente. A semente se encontra com o sol e quando reencontra a chuva já é broto. Nos encontros e desencontros a semente se perde a si mesma e se estranha quando chove e o espelho de água formado ao seu pé revela a flor que ainda se imaginava semente e que se perdeu em si porque não percebeu a passiva mudança nos seus encontros.
Quando percebo o que mudou, já perdi aquilo que eu era. Nesse momento se dá a autoconsciência, que é o encontro comigo mesmo em tudo aquilo que fui, sou e poderei ser. O futuro é contingente. Apenas possível para encontros que fazem me perder do presente e morrer no passado. O ser humano sempre se encontra e se perde apenas e tão somente em si mesmo. Eis o dilema da existência.

Sidinei Cruz Sobrinho
Guaporé, 31 de outubro de 2008