16.1.14

Suicídio



De tempos em tempos é imprescindível praticar pequenos suicídios.
Matar, aqui ou ali, dentro de si, experiências definhadas.
Apagar da memória as páginas rascunhadas.
Permitir-se sofrer de uma morte breve.

Recolhe-te dentro de ti mesmo.
Vá preparado para uma batalha.
Leve todas as armas necessárias.
Muitas delas falharão.
Morra dos excessos de si.
Ataque sem piedade aquilo
Que já não te serve mais.

Não é necessário cultivar muitas memórias para ser lembrado.
Inevitavelmente será esquecido. Por muitos, sequer conhecido.
É uma burrice humana essa coisa de se imortalizar.
Esteja pronto para sacrificar os demônios, disfarçados de anjos sapecas.
Não se iluda.
Cuidado.
Existe muito mais num pedaço de papel guardado, que uma simples lembrança.
Sente-se, confortavelmente no meio dos teus arquivos.
Rasque tudo o que puder.
Atenção!
Não excites.
Eles são bons conquistadores e não precisam muito esforço para te fazer desistir.
Segue firme e resoluto.
Você já é realmente adulto o bastante?
Desapegue.
Respeite apenas os livros, pois eis que estes sempre são outros a cada visita.
Jogue fora.
Queime.
Dilacere.
Livre-se de tudo o que te causa demasiada nostalgia.
Viver é preciso.
Morrer, também.
Não se consegue ir muito longe com um fardo muito pesado.
Sim, doerá e talvez você tenha que parar um pouco pra chorar.
Pare se for preciso.
Jamais volte atrás.
Não te arrependa.
Atire de modo certeiro para que não reste suspiro de misericórdia.
Vai, olhe nos teus olhos.
Olhe e puxe o gatilho.
Morrer é sabedoria.
Renascer é dolorido.
Morre numa noite fria.
Campo florido.
Atire.
Morte metafísica.
Talvez você não sobreviva.
Suicídio da maldade.
O que é a vida,
Senão aprender a morrer
De verdade?

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